Memórias do futuro: escavando a era jato no terminal TWA Mark Dery |
"De uma coisa sinto falta: do tempo em que a América tinha grandes sonhos de futuro. Cada ano havia uma nova descoberta científica ou uma nova invenção e todos pensavam que o futuro ficava ainda mais maravilhoso. Agora parece que ninguém tem grandes esperanças para o futuro. Parece que pensamos que o futuro será exatamente como é agora, mas pior." Rocket Garden É 2002; você sabe onde está seu futuro? O futuro é tão obsoleto quanto é singularmente arcaico o cheiro de naftalina da nave espacial desativada no Rocket Garden, do Centro Espacial Kennedy - relíquias da década mais otimista, quando o romantismo da audácia de ir aonde ninguém jamais havia chegado, imortalizado em toda a extensão do foguete Apollo trovejante em direção ao céu, rompendo-o ruidosamente em missão de controle seduziu a cativa imaginação coletiva. Agora, no despertar da ilha Three-Mile e do canal Love, Bhopal e Chernobyl, estamos perdendo nossa religião. Quebrada a fé no avanço da grande ciência e no progresso tecnológico, o entusiasmo americano por aventuras extraterrestres arrefeceu, especialmente em um tempo de gastos elevados à cifra de bilhões de dólares com a operação anual do programa espacial (Wade 1993, 34). Nos Estados Unidos, pessoas já votam através de seus controles remotos. A audiência de American citizenry não pode ser importunada em função de acompanhar mais um desgastado lançamento espacial, pois cansou daquilo que o escritor de ciências Nicholas Wade chama de "gestos sem importância e geralmente estúpidos" dos astronautas (34). Estamos, como diz o escritor de ficção científica J. G. Ballard, revendo a Era Espacial e as precipitadas visões do império, de recursos inesgotáveis e de soluções para problemas sociais ao simples toque de um botão, que então eram simbolizadas. Em "Memórias da Era Espacial", Ballard imagina uma Flórida apocalíptica, onde a grua do Cabo Canaveral enferruja ao sol, como um monumento fúnebre ao sonho da velocidade de lançamento: "Uma aura ameaçadora emana destas torres antigas, tão velhas em suas formas quanto as grandes colunas do templo de Karnak, carregadas de uma diferente ordem cósmica, símbolos de uma visão abandonada do universo..." (Ballard 1991, 137). Mesmo que a Era Espacial vão desaparecendo no espelho retrovisor da história, suas fantasias de gravidade zero, de limites para crescimento e, até mesmo, da mortalidade nessa era ciberespacial, nas visões do cérebro efervescente, explodiram recentemente e espalharam-se em instantes no ar rarefeito dos desvantajosos domínios de internet; no sonho "guerreiro do frio" (cold-warrior) em dispor de um sistema antimíssil capaz de blindar a Fortaleza Americana em uma inexpugnável bolha; e nas predições dos futuristas da alquimia da nanotecnologia que transforma lixo em ouro e da necromancia criogênica que garante imortalidade - o jogo técnico-fundamentalista congela sua cabeça, como diz o palhaço, para salvar seu traseiro. Não que a semelhança com as coisas do passado faça-nos um pouco menos afetuosamente condescendentes com os obsoletos amanhãs de outrora e suas décadas estúpidas. A virada do milênio, moldada pela estética do Universo Pop de 1960, está saturada do orgulho de "estar lá", de "ter feito isto", da cultura pós-tudo. Ao mesmo tempo, um fervoroso anseio oculta o irônico GenX/Boomer o fetiche por cadeiras Egg , por tapetes de pelúcia, pela música para jovens da Era Espacial e por outras criações retrô0-futuristas kitsch: desejo exclusivo de um futuro que nunca existiu. "O design de 1960 ... expressou o otimismo coletivo .... que os americanos sentiam sobre nossa corrida para ... a lua", disse Scott Reilly, fundador do "projeto do supersite de internet para o século 20", retromodern.com. "Foi uma oportunidade de vislumbrar o que o futuro pode parecer para uma geração - mas temos isto agora" (citado em Fraunfelder, 1998). Da revista Wallpaper para os filmes de Austin Powers, da Ball Chair de Eero Aarnio, destaque da capa da Harper's Bazaar em 1967, para a cadeira icônica de Jacobsen no anúncio da J. Crew, a nostalgia de futuro, de uma só vez profundamente sincera e profundamente irônica, é parte essencial da ressaca pós-milênio. Uma extravagante elegia para a Morte do Futuro, a febre do modernismo da metade do século, nasceu do desejo articulado pelo DJ nova-iorquino e colecionador de clássicos eletrônicos, Frankie Inglese, que lamentou em 1998: "O ano 2000 está próximo. Temos grandes tecnologias, como os telefones celulares, a Internet e as câmeras digitais. Mas ainda estamos sentados nas coisas feias da Ikea. Não se esperava que o futuro parecesse com isto" (citado em Chaplin 1998, 2). Essencialmente, esperava-se que o futuro fosse como o Terminal TWA de Eero Saarinen, infinitamente celebrado em revistas de design e que presta homenagem a Bo Welch em seu esboço de centro intergaláctico no filme Homens de Preto. Mais que qualquer outro critério do estilo da Era Espacial, o Terminal TWA abarcou como um símbolo de coisas do devir que nunca chegaram. CONDIÇÃO TERMINAL O triste estado do atual prédio, que cada dia parece mais e mais com o pensamento de Ballard, ruínas dos futuros passados, é o principal indicador cultural de que o futuro não é exatamente como costumava ser. Aficcionados por design que só conhecem o vôo rasante das asas de uma gaivota através das fotos de Ezra Stollers na monografia reverente, o Terminal TWA é uma dura realidade, para quem peregrina no inoportuno e elegante aeroporto JFK em Nova Iorque. Comparados à conclusão do prédio em 1962, elegantes estudos em branco e preto de Stoller fazem-no parecer, imediatamente, antigo e futurista: "Pássaro no Espaço (Bird in Space)", de Brancusis, re-imaginou-o como um monumento faraônico. O balcão de informações eleva-se do chão, todo em curvas sinuosas, os painéis de controle de chegada e partida de vôos mais parecem televisores para aliens ou obeliscos saídos das profundezas espaciais. O homem de negócios, magro e engravatado, e a mulher branca, usando luvas, de Stoller, passam debaixo de arcos e de uma cripta limite que dá ao terminal um ar, decididamente, de igreja - efeito certamente intencional, dívida dos arquitetos com a Capela em Ronchamp, de Le Corbusier. (A que eu igreja eu freqüentava quando garoto, em um subúrbio do Sul da Califórnia, era o posto da metáfora arquitetural de Saariner. Em forma de pirâmide de pirâmide da Era Espacial, a Igreja Luterana de St. Mark em Chula Vista parece com uma casa construída em uma sequóia canadense em uma plataforma de lançamento: casa de culto religioso como uma rústica espaçonave, um visual tropo que reconcilia a época da vibração da granola crocante com o seu espírito pioneiro de viagem às estrelas. Projetado em 1966 por Robert Des Lauriers, St. Mak's serve a dois mestres, esteticamente falando: a volta para o nudismo rousseano da contracultura e o futurismo da corrida espacial e da popularização das viagens aéreas - estremecimento de cultura cujos tremores foram profundamente sentidos no Sul da Califórnia, onde a indústria aeronáutica era uma das principais empregadoras. Daquele momento em que projetou St. Mark, o arquiteto recorda: "Todos pensava em fazer coisas espaciais". Des Lauriers construiu a própria fama como o criador das igrejas modernistas por todo Sul da Califórnia. Seu flerte com a estética alcançou vertiginoso apogeu na Igreja Luterana Carlton Hills em Santee, uma semáforo Jetsoniano cujos "efeitos de vôo", diz Des Lauriers, exploram a hiperbólica parabolóide.) Em seu apogeu, o Terminal TWA era uma catedral da Era Jato, consagrado para a velocidade e - sem querer - como a faca de dois gumes do utopismo tecnológico, que sustentou sua fé em um futuro cujo cromado nunca descascaria. Após sua última visita ao canteiro de obras, Saarinen (que morreu logo após o término da construção) observou: "Se nada acontecer e eles parar de trabalhar exatamente neste instante, deixando tudo como está, acho teríamos uma bela ruína, como o Banho de Caracalla" (citado em Lamster 1999, 5). Seu sonho está virando realidade, com bem menos melancolia sublime e bem mais melancolia de ponto de ônibus que ele poderia imaginar. Era uma vez o terminal que era "um destino nele mesmo", segundo o crítico arquitetônico Mark Lamster. "Suas elegantes lanchonetes, clubes e salas de estar (o andar da galeria onde hoje ficam o restaurante e a cafeteria foram de fato projetados para o escritório do industrial Raymond Loewy) ofereceram espetaculares vistas locais e o frisson de unificar em grande estilo o novo jet set" (Lamster 1999, 4). Agora, apesar do status de ponto de referência, o terminal está em estado terminal. Suas paredes de concreto não conseguem disfarçar as crostas de remendos malfeitos; seus do tamanho de selos de carta estão esfarelados, seu Café Paris, que uma vez foi elegante, deteriorou-se pela ação de reformas desleixadas; os estofados, nas salas de estar Lisbon, estão rasgados e com o estofamento à mostra. Ironicamente, o mestre de obras de Saarinen estava preparado para a demolição desde o primeiro dia. Projetado para aeronaves de propulsão à hélice, ficou muito pequeno para o tráfego humano e logo precisou acomodar uma invasão desencadeada pelo advento do comércio de aeronaves à jato, como o Boeing 707 e o Douglas DC-8. Arquétipo aerodinâmico de vida em Mach 1, o Terminal TWA esteve fora de seu tempo desde sempre. PERCEPÇÃO DE CATEGORIA Tempo e ironia transformaram o mestre de obras de Saarinen em uma elegia à Era Jato, quando o mundo acima das nuvens pertencia apenas aos executivos bem-vestidos e às aeromoças sorridentes, enquanto o formigueiro humano viajava via terrestre, meio mais apropriado à sua situação econômica. Uma mistura sedutora de elegância e bom gosto ultramoderno da classe alta, partes iguais de avião de carreira e de modelos Cunard, diante da altitude de cruzeiro. Em editorial de janeiro de 2001, no estertor da falida TWA, cujos bens seriam adquiridos pela América Airlines, a aeromoça aposentada da TWA Ann Hood reflete melancolicamente acerca da era passada quando atendentes de luvas brancas, como ela, serviam chateaubriand, preparavam o martini perfeito e "temperavam as costeletas de cordeiro com minúsculas lâminas folhadas em ouro - habilidades mundanas adquiridas na academia de treinamento da companhia, "um complexo de escritórios ao estilo Jetson, com salas de estar rebaixadas e mobílias modulares" (Hood, 2001). Para uma menina, como Hood, de uma pequena cidade, a fascinante linha aérea "representava o futuro". Ela lamenta o fim da era "quando o TWA era todo primeira classe", um nítida decadência diante de seus olhos, pela substituição de cremeiras equilibradas em bandejas de prata por copos de isopor recolhidos por atendentes melancólicas que arrastam, corredores abaixo, sacos de lixos. Os anos 70 testemunharam a desregulamentação da viagem aérea, disponibilizando passagens mais baratas; nessa época, a Boeing, introduziu o modelo de avião com mais de um corredor; "gigante" jumbo 747 era capaz de transportar o dobro de passageiro dos outros modelos anteriores. Deste modo, o jet set foi democratizado - em nome da redução do efeito disso na cabeça de alguns. Em 1978, um porta-voz americano já reclamava, na história social da viagem aérea de Kenneth Hudson e Julian Pettifer, Diamonds in the Sky (Diamantes no céu): "Viagem aérea não é mais o grande lance. Ela se tornou o serviço de ônibus da nação" (Hudson e Pettifer 1979, 199). Como os autores registram: "Muitas pessoas, especialmente aquelas em posição de poder e influência, não gostam de viajar de ônibus" (199). A isso pode ser acrescentado que não gostam de viajar acompanhados da classe que costuma viajar de ônibus. Os bem-aventurados devem contabilizar suas bênçãos. Pois, para as massas, viagem aérea significa comida intragável, espaço apertado e terríveis demonstrações por parte da tripulação. Em seu romance neogótico, Hannibal, Thomas Harris evoca os horrores da viagem aérea para o baixo clero quando seu anti-herói, Hannibal Lecter, opta por voar (céu afora!) na classe econômica. Lecter é um canibal bem nascido que tem atração por Mozart, por lustre Steuben e por estripar caipiras grosseiros fervorosamente alinhados com George Will e sua cultura das guerras. Mas veja! Como o poderoso estava decadente: lamentavelmente, Lecter é forçado a viajar incógnito com a bagagem, intocável. Harris ambienta a cena: O espaço para ombro é de 20 polegadas. Para o quadril, entre os dois descansos para os braços, a oferta também é de 20 polegadas. São duas polegadas a mais de espaço de que um escravo dispunha na Idade Média. Os passageiros estão sendo espremidos como sanduíches congelados/resfriados de carne e queijo processado, além de re-respirar os peidos e a exalação de outros no ar reprocessado economicamente, uma variação do princípio oficial do chorume estabelecido por comerciantes de gado e porco nos anos 50 (Harris 1999, 247). É compreensível, dadas tais condições, que essa "fúria aérea", se não canibalismo em série, esteja em ascensão. A condição introduzida no léxico de meios de comunicação em 1995, quando um cliente bêbado registrou seu protesto após acusar a tripulação de negar-lhe outro Martini, baixando bruscamente as calças e aliviando-se no carrinho de bebidas. Desde então, comissários de vôo são esmurrados, mijados, arremessados conta qualquer anteparo e golpeados com garrafas. Claramente, os bárbaros estão nos portões de embarque. Em harmonia com os bons tempos, tradição pseudo-intelectual da política interna de vigilância de fronteiras entre a multidão e o poder da elite, alguns especialistas insinuaram que a "fúria aérea" era o resultado inevitável da erosão dos valores tradicionais, especificamente, o fim de nosso inquestionável respeito por um homem de uniforme. "Passageiros perderam o respeito pelo piloto, pelos encarregados de vôo e por qualquer outro. É o que acontece", alerta o Dr. Arnold Nerenberg, um "Whittier", californiano que toma como base de sua teses a "fúria do trânsito" (citado em Elliot 1998a). O cara fortão com maxilar proeminente - fantasia de todo homem pressionado pela ditadura da beleza e sonho de físico avantajado de toda mulher - esboroou-se com Aeroporto e Café, Chá ou eu? Hudson e Pettifer (1979) oferecem uma leitura freudiana, seca e engraçada, do piloto como chefe de família: Durante toda década 1920 e 1930, e certamente nos anos de guerra, pilotos chegaram a ter quase status de deuses, pelo que faziam e pelo que eram... Psicólogos foram mais longe ao enxergar o piloto como a perfeita figura paterna. Como tal, seu fortalecimento, encorajamento e influência devem ser irradiados pela aeronave. Se sua primeira tarefa é pilotar o avião com segurança, a segunda é tranqüilizar os passageiros, assegurando que estejam em boas mãos... Apenas a palavra do comandante já é garantia necessária para reduzir a ansiedade dos passageiros ao mais baixo nível possível. Se a informação deveria ser transmitida em vez de vibrar diretamente como a voz da figura paterna, a comunicação deve produzir efeito semelhante nos passageiros; é como diz o capitão McGregor: "Estaremos em Paris na horam em que o sol ainda brilha por lá". O uso ritualístico do seu nome é essencial para o máximo efeito tranqüilizante. Ou então, a teoria já era (156-157). Podemos pensar ainda sobre o fato de que o tom de voz do capitão muito se pareça com outra invisível modulação: o do Deus (judaico-cristão) do céu. Como o elogio de Ronald Reagan para a tripulação do mal fadado Challenger ("Eles tocaram a face de Deus") sugere, fanáticos do sistema da Era do Bronze ainda pensam o Grande Cara como, você sabe, alguém lá em cima. Portanto, é compreensível que pilotos, em casa ou nos céus, tenham "quase status de deuses". Ao contrário, isso também leva a raciocinar que nosso pai celestial deve ser imaginado como um piloto. Lembra, Deus é meu co-piloto? E não é o bíblico Capitão Yahweh sempre emitindo proféticos boletins sobre algum tipos de sistema cósmico PA ou através de emissários uniformizados que voltam daquele exaltado plano de vôo, o Sagrado dos Sagrados, com mensagens válidas para "o uso ritualístico de Seu nome"? Como fã fundamentalista de "Xtrem" (levando a uma superinterpretação extrema) não posso resistir a nada que a tradicionalmente atendente feminina de vôo suporta pela Sagrada Mãe, em nossa teologia da Era Jato. Como Hudson e Pettifer (1979) chamam a atenção: Se o piloto é pai, a aeromoça é mãe, cuidando a criança dela, escutando e olhando para ver se um está chorando ou infeliz, sempre disposta a oferecer palavras de conforto e um sorriso compreensivo (157). Entretanto, do mesmo modo que em meio século de visões dos terminais, como modernos "portos de jatos", deram lugar à monótona realidade de nossa superlotada estação de esqui Greyound, pilotos foram rebaixados de divindades ou arrojados capitães de naves estelares à categoria de meros motoristas insones de Airbus. Como o comediante George Carlin evidencia em seu quadro "Aviso Airline" (em Jammin em Nova Iorque): "Quem fez deste homem um capitão, posso perguntar? Por acaso dormi durante algum tipo de cerimônia de juramento das forças armadas ou coisa do gênero? Ele é um maldito piloto. Deixem-no ser feliz com isto!" Para ainda maior insulto ferino, sistemas computadorizados a cada dia ficam mais perto da meta de ficção científica de HAL no controle; em lugar nenhum, a sombra de iminente obsolescência humana deitou tão longa e escura na cabine do caça ou do avião comercial, onde os sistemas de pilotagem automática e o de direcionamento de vôo podem um dia deixar os pilotos humanos desempregados. CABINE FEBRIL Então, como o senso comum (e Hannibal Lecter) parecia sugerir, a recente queda dos preços nas passagens da aviação civil, seguramente, tem menos a ver com nossa perda de respeito por autoridade do que com o o cozimento em banho-maria da luta de classes que atinge o ponto de ebulição quando um proletário fica encurralado na classe econômica a respirar peidos reciclados e sufocando-se de McGlop, enquanto o cheiro da comida de primeira classe passeia pelo ar, zombando, corredor abaixo, e fazendo alusão aos privilégios da categoria. (Esta não é uma defesa ou apologia à fuga ou da passagem despercebida da sala de espera de Darwin, como vocalista aposentado da banda Stone Roses, Ian Brown, que proporcionou um show surpresa num vôo da British Airways em 1998. Depois, ameaçando cortar fora as mãos de um comissário de vôo, Brown esmurrou a porta da cabine enquanto o piloto e co-piloto tentavam pousar o avião. Obviamente, sociopatas como Brown, deveriam, afinal de contas, voar junto de Rottweiler devidamente dopados no compartimento de carga.) Não há como rejeitar o fato de que a busca sem noção da indústria pela maximização do lucro transformou os aviões em panelas de pressão social e psicológica. Um típico exemplo dos cálculos da ganância é a introdução dos estreitos, compostos por materiais e desenhos ergonômicos, com espessura de encosto reduzida em 40%, exacerbando a superlotação da lata de sardinha na classe de preços mais acessíveis. As empresas de transporte aéreo poderiam deixar o lugar para colocar as pernas liberado ao escasso encosto de seus passageiros; em vez disso, usam o recém disponível espaço para - você até já imaginou isto - mais bancos . Nestes tempos de crescente disparidade de rendimento, os desvalidos têm algo para queimar: atitude crítica. Viagem aérea, um ampliador de diferenças de classes desde os tempos do jet set, é um desagradável aviso às massas dos "sem-classe" americanos de que o abismo socioeconômico entre eles e o novo novo-rico é um verdadeiro Grand Canyon . O crítico cultural Tom Vanderbilt interpreta o projeto da cabine comercial como "um microcosmo do crescente desequilíbrio da riqueza global... raramente se tem uma divisão entre o ter o e não tersob as asas do 'motor do capitalismo' tão nu, se educadamente expressado" (Vanderbilt 2000, 73). Para cada "digeratus"* contemplando o tempo compartilhado no anúncio da Lear Jet na Wired, para cada rapaz/moça talentoso (a) voando alto em seu superdescolado helicóptero, como Jim Clark em "A coisa supernova" (The New New Thing) para cada magnata dono de site, como Mark Cuban, comprando um jato Gulfstream V, de US$ 40 milhões, "porque eu posso", há incontáveis "lúmpens" abarrotados em veículos aéreos feito gado. Misture seus cérebros privados de oxigênio e irrigados com birita, esfregue seus narizes no amplo espaço pata colocar os pés e espiar lisonjeiros coquetéis no outro lado da cortina, na "classe alta" do Virgin Atlantic ou na "elite" do Delta, e você tem a receita de uma guerra de classes a 35 mil pés de altura. A despeito de sua hilariante garantia de que não é nem comunista nem democrata, o "Viajante Raivoso", do ABC-NEWS.com, do colunista Christopher Elliot, aponta sinais alarmantes da consciência de classe (Econômica) ao relatar a experiência de uma leitora chamada Julie. Sentada na primeira classe, olhando outras almas menos afortunadas, embaçadas, Julie experimentou um repentino acesso de solidariedade com suas companheiras da classe econômica. "Como eles passaram por ela", escreve Elliott, citando Julie: Um menininho - com cerca de 3 anos - disse para sua mãe, que estava segurando um bebê: "Mamãe, vamos sentar em um destes bancos. Eles parecem mais confortáveis". Claro, eles inclinam para trás. "De alguma maneira", conclui Julie, "isto não parece certo" (Elliott 1998b). A primeira classe e a classe econômica oferecem uma maravilhosa lição cívica ao dramatizar o fato de que, em uma nação ainda mais privatizada, os lucros dos ricos podem ser as perdas da classe baixa, comprado a preço menor, intermediado por uma esfera pública mesquinha. Reconhecendo que o espaço é de reduzidas dimensões nos aviões comerciais, Elliott propõe, como solução radical a eliminação da primeira classe: "Livrar-se daquelas poltronas maiores [e], em separado, aumentar a distância entre as poltronas da classe econômica", ele argumenta, em um subtítulo da coluna "Pouco luxo em muito gasto" (Few Luxuriate at Expense of Many)(Elliott 1998c). (Não que ele seja um comunista ou qualquer coisa!) De acordo com Elliot, "as companhias aéreas sabem que isso é o certo a fazer, mas elas se escondem num sem número de desculpas esfarrapadas. Elas alegam que seus clientes habituais não tolerariam a eliminação da primeira classe e que elas não obteriam lucro com a configuração de uma única classe. (Na verdade, mais da metade das poltronas da primeira classe estão ocupadas com passageiros usando programas de recompensas por uso do serviço, as milhagens, o que corrói o argumento do lucro".) (Elliott 1998c). A estratificação das classes pelas poltronas dos aviões tem menos a ver com a lógica do mercado. Antes, se desdobra na perpetuação do mito de que a Era Jato acabou - aquela viagem aérea ainda representa vida luxuosa, comodidades e empregados sorridentes que aparecem tão logo o botão de chamada é acionado. As poltronas da primeira classe são para o avião comercial o que o mito de Horatio Alger é para o capitalismo americano: o suculento bocado de comida na ponta do anzol. O mito do homem bem-sucedido e a tática no campo de jogo permanecem trabalhando duro, perfurando aqueles cartões-ponto. Isso assegura também sua resistência às injustiças de um rígido sistema em favor dos nascidos com a cor da pele certa, com os cromossomos adequados e com os códigos de endereçamento postais convenientes. Similarmente, a fantasia de um dia aterrissar na categoria dos tributáveis, conquistada com o direito a uma poltrona de primeira classe ou de ser repentinamente valorizado, como Cinderela, a esse status, a classe alta ajuda os desafortunados durante o vôo. "Para os viajantes eventuais, a primeira classe pode ser como ganhar na loteria", diz Margaret Frey, de Jericho, Vermont. "Sempre há a esperança de que você possa ser colocado em um desses" (citado em Elliott 1998b). Cochilando bem ereto, no desumano ângulo que apenas um projetista de cabine poderia chamar de "reclinado", sofrendo uma dor de cabeça de rachar o crânio, fruto da redução do volume de ar disponível, abstraindo os efeitos posteriores daquela carne escorregadia e do queijo processado, podemos sonhar com dias melhores, não podemos? CAMPO DE DESTROÇOS Bastaria isso para dizer que a Era Jato, encarnada pelo Terminal TWA, está completamente acabada e, com ela, a crença de que estamos livres para decolar na direção de um brilhante amanhã, superplanejado por engenheiros sociais e protegido por tecnocratas, que garantem a pontualidade dos monotrilhos. As nuvens carregadas com as nossas tristeza coletiva e perda de fé em tecnologia e teleologia estão, aos poucos, assumindo uma forma perceptível. Trata-se da forma de um jato lançado na direção de uma certa maldição. Ironicamente, o crescente medo de voar une-se a uma época em que o triunfo sobre o tempo e o espaço supostamente possibilitado pelo email e pela teleconferência poderia ter tornado a viagem a jato ultrapassada. Prematuramente, rapsodistas da realidade virtual, como Timothy Leary, lamentaram o incômodo da ambientalmente antipática necessidade de arrastar nossos corpos de uma zona de tempo a outra, aguardando ansiosamente o dia em que viagens de negócio poderiam significar rolar da cama para um ambiente de realidade virtual. Do mesmo modo que o escritório sem-papéis, a teleconferência cibernética, em sua corporação abandonada na sua casinha eletrônica, é ainda uma fantasia de satisfação de desejo. Até o "homo cyber"" não pode parecer perturbar suas necessidades vestigiais ao interagir em espaço carnal, em tempo real - uma evolucionária ressaca enfatizada por expressões reveladoras, como, por exemplo, "face a face" e "apertar as mãos". Estatisticamente, vôos comerciais nunca estiveram a salvo: nos Estados Unidos, por exemplo, houve 394 mortes relacionadas com aviação em 1996; por comparação, 41.907 americanos morreram em acidentes de carro naquele ano. Mesmo assim, o aumento no número de escalas para ocupar assentos, nas palavras de uma reportagem de 1996, refere que "se a atual taxa de acidentes permanecer estável, e as viagens aéreas continuarem a crescer rapidamente, um jato de passageiros pode cair tão freqüentemente quanto uma vez por semana até o ano 2010" (citado em MacPherson 1998, x). Evidências anedóticas sugerem que o medo de voar está em ascensão, atiçado por relatos de mórbidos tablóides especializados em desastres aéreos. Construídas a partir da gravação da caixa-preta com as conversações trágicas e frenéticas da cabine, essas reportagens, inevitavelmente, detalham, segundo por segundo, a contagem regressiva até o impacto. Elas oferecem poltronas na primeira fila para um filme de desastre completo de outra pessoa da vida real, com as últimas palavras saídas do coração rasgado dos membros de uma tripulação que sabe da morte iminente ("Amy, eu te amo" ou "Oh, mamãe, vou sentir falta daqueles jogos de beisebol") e o clamor de alarmes e vozes robóticas gritando: "Terreno! Terreno! Parar! Parar!" Parece estar chovendo aviões do céu nestes dias. Da misteriosa explosão do vôo 800 da TWA, cujas entranhas ainda estão sendo examinadas em busca de conspiração terrorista, ao mergulho de nariz do vôo 900 da EgyptAir, terra fértil para caricaturas anti-árabes de um piloto muçulmano em missão suicida divina, ao acidente de um Concorde, que extinguiu as máquinas de um futuro supersônico que nunca veio, como o triste, e de seu próprio jeito doce, último passageiro bobo. Nossas telas mentais piscam com imagens de aviões caindo de barriga e estourando em chamas, com os peritos da Associação Nacional de Transporte e Segurança, selecionando, sinistramente, nos "campos de destroços" da aeronave reconstruída no chão do hangar, seus fragmentos, traçando linhas gerais de causas de acidentes, como esqueletos de baleias encalhadas na praia. O campo de destroços é o cemitério do futurismo da Era Jato, e a frenética tagarelice da caixa-preta, seu epitáfio perturbador. O que são estes dias em que nos vemos sob o domínio de uma ferramenta de sedução capaz de nos atrair para websites, como o www.PlaneCrashInfo.com, ou para jogos, como Charlie Victor Romeo, onde encontramos uma dramatização com direito a restos carnais de desastres aéreos baseada na gravação das vozes da cabine? Seus apelos são justamente a versão sufocada do que Ballard chamou de "poder erótico do desastre"? Nossa atração por eles parte da mesma psicopatologia de cada dia da vida que nos faz espectadores do múltiplo engavetamento de carros ou de tablóides da TV "shockumentaries"? Não se pode negar o subtexto voyerista do PlanCrashInfo.com, um site para aficcionados em aviação que parece, às vezes, como a versão desastre aéreo de uma cabine de vídeos pornô, em que o incontrolável mergulho são as preliminares, e o momento do impacto, a senha para o aviso de que é preciso mais moedas para ver a seqüência inteira. Nesses sites, on-line, visitantes podem olhar fotos de acidentes, passar os olhos nas sinistras estatísticas ("Risco de Mortalidade por Tipo de Serviço Programado"), estimular-se de acordo com a atual variação de avisos da cabine automatizada ("Parar!", "Vento cortante!", "Não baixar!"), e, o mais repugnante de todos, reviver os últimos segundos de aviões condenados através das gravações da caixa-preta ("Cuidado, pode ser inquietante"). A caixa-preta: Toda Nova Voz da Cabine Gravada Presta Conta dos Acidentes em Vôo (The Black Box: All New Cockpit Voice Recorder Accounts of In-Flight Accidents), livro escrito pelo correspondente da Newsweek Malcolm MacPherson (1998), escava o mesmo campo psíquico de destroços. Llivro de cabeceira em relação a restos inutilizados de aviões, "A Caixa Preta...") é também um emocionante passeio ao inferno, uma memorial sacudida em vítimas anônimas da sobrecarga de informação, além de uma existencial comédia de erros, como a do piloto chinês de um jato da Boeing, perdido em neblina e desnorteado pela proximidade da base no sistema de aviso, dizendo para ele, em inglês, para "Pull up! Pull up!" (Parar! Parar!), pergunta: "what means (O que significa?), 'Pull up'?" (MacPherson 1998, xiv). Mas qual é o significado deste fascínio pelo pequeno e mórbido livro além do óbvio interminável apelo de (de alguém mais) morrer? Talvez, tenha algo a ver com catarse, indiretamente com sobreviver ao pior pesadelo de uma sociedade de alta tecnologia que parece estar se deslocando cada vez mais no piloto automático. Nesta era de sistema complexo e de tecnologia autônoma, a falha de um software, o defeito de hardware ou os erros humanos fatais tornam a tentativa de resolver muitas questões de velocidade da máquina em desastre. Encolhendo-se, cabeças para baixo, na parte popa da fuselagem, nos perguntamos se o fim virá em ardente agonia ou instantaneamente como o julgamento sumário da "múltipla separação anatômica secundária para impacto de velocidade", na poesia anti-séptica da reportagem de um investigador de casos citada em The Black Box (112). Todavia, estamos sendo convidados, mais e mais, a acreditarmos nas tecnologias cuja velocidade e complexidade fazem os humanos comer poeira, mesmo que aquela confiança seja corroída em primeira mão pelo instável "glitchy", vírus que infestou o ambiente virtual de computadores, e, no nível social, por histórias de tablóides sobre aviões caindo do céu. Apesar das tranqüilizadoras estatísticas sobre segurança em vôo comercial, apesar de "A Caixa-Preta..." descortina aquilo que alguns de nós imaginamos ser o drama dos bastidores tomando assento na poltrona atrás da fachada legal da sociedade tecnocrática do conhecimento especializado e de infalível tecnologia. Às vezes, é precisamente nossa extrema confiança em tecnologia - nossa fé fundamentalista na onisciência das máquinas inteligentes - que causa a nossa destruição. No caso do vôo Aeroperu 603 (incluído em "A Caixa-Preta..."), o altímetro, o indicador de velocidade aérea, e outros instrumentos de funcionamento duvidoso forneciam leituras que pilotos sabiam imprecisas. Como um piloto comercial citou em artigo do Wall Street Journa: "O cérebro do piloto automático e o sistema de auto-orientação entraram em pane. Toda a tripulação teve que desligá-los e conduzir o avião" (citado em Lawrence 2000). Tragicamente, o piloto não conseguiu reiniciar o computador e nem contar com seu próprio conhecimento especializado, uma vez que estava refém e crescentemente frustrado com as leituras desorientadoras que o computador fornecia. Afogado em informações imprecisas e forçado a tomar decisões de vida ou morte, na velocidade da máquina, o piloto confiou sua profunda fé na onisciência artificial e derrotou a confiança em suas próprias habilidades, com resultados desastrosos. Às vezes, claro, coisas ruins acontecem com pessoas puras. Um candidato óbvio para o Darwin Award, em "A Caixa Preta...", é o anônimo, incompetente e imprudente comandante tão "relaxado" numa inexpressiva cara-de-pau em posterior reportagem na NTSB, dizendo que não prestara atenção ao acúmulo de gelo nas asas ou ao fato de que havia programado de forma equivocada o plano de vôo no piloto automático, provocando uma abrupta perda de velocidade da aeronave e a conseqüente queda vertiginosa de 12 mil pés até a assustada tripulação recuperar o controle (MacPherson 1998, cap. 19). Mais tragicamente, há o caso da nobre equipe de manutenção de terra que esqueceu de remover um pedaço de fita isolante do orifício de pressão estática num Boeing 757 depois de lava-lo, cegando efetivamente o avião; incapaz de ler a velocidade do ar ou a altitude, a tripulação voou para o mar, matando todos a bordo (MacPherson 1998, cap. 2). Mas o clichê de que o erro humano seja o mais fraco elo em qualquer corrente ciborgue é a moral de apenas algumas das fábulas da era da informação de MacPherson. Em outras, as máquinas piraram, tomando quase deliberadamente atitudes perversas. Em 26 de maio de 1991, o vôo 004 da Lauda estava a 4 mil pés acima da Tailândia quando, por alguma razão desconhecida - talvez a falha de uma válvula de isolamento, quem sabe? - um dos reversos do jato se abriu. Reversos são equipamentos localizados nas partes traseiras de ambas as asas que servem frear o avião no chão. "A abertura dos reversos é, por definição, catastrófica", anota MacPherson. "Isto é quase impensável" (MacPherson 1998, 27). O avião desintegrou-se em pleno ar. Interpretar como mito "pós-industrial" as aventuras de gente amontoada em um cilindro de metal pressurizado, riscando o céu em velocidade supersônica em uma máquina (e dois ou três encarregados técnicos no leme), fornece uma concisa metáfora para a situação desagradável de nossa sociedade no ano 2001. Crescentemente, aqueles entre nós que não dominam fluentemente o código sentem medo de não permanecer tranqüilos ante a resposta para a questão que não ousamos elaborar - "Afinal, quem está pilotando esta coisa?" - "Ninguém". Como capitão da Força Aérea John Varljen, que trabalha no Pentágono, disse a um repórter de jornal: "Estamos começando a pensar na aeronave como mais um membro da tripulação. Como a aeronave torna-se cada vez mais esperta, é como se o avião se desligasse e fizesse coisas que você não espera" (citado em Lawrence, 2000). Faça uma boa viagem. Ironicamente, no indesejável evento em que você ou eu tornamo-nos um dos poucos malfadados que morrem em acidente de avião comercial, a última voz que ouvimos pode ser artificial, como o automático anúncio que friamente informou aos passageiros do vôo Korean 007, enquanto eles despencavam em direção ao oceano, depois de um MIG soviético derrubá-lo com um míssil: "Jogue fora seu cigarro. Isto é um pouso de emergência. Jogue fora seu cigarro. Isto é um pouso de emergência. Coloque a máscara sobre o seu nariz e boca e ajuste a faixa na cabeça. Coloque a máscara sobre seu nariz e boca..." (MacPherson 1998, 35). Morte, na era do computador, às vezes, tem a aparência de uma péssima apresentação de Laurie Anderson. SAGUÃO DE EMBARQUE Em um dia de inverno cinza no distante 2000, fiz um passeio no Terminal TWA para ver a expressão do santuário de Saarinen em relação ao futurismo da Era Jato. Examinando aquele vazio do ecoante saguão, ecoando vestíbulo (fui num um dia em que não estava previsto um grande movimento), afetando um ar com jeito de Clube Embaixador de quem vai para a área VIP de embarque, compreendi que o terminal tinha algumas coisas da "estética discutível" evidenciada pelo crítico de arte Ralph Rugoff. Em Scene of the Crime (Cena do Crime), Rugoff argumenta que o artista de vanguarda dos anos 70 tinha cooptado a semiótica da cena do crime e da investigação da zona de desastre para formular suas instalações críticas e representar psicodramas. Tal estética discutível, diz Rugoff, é caracterizada por "um forte senso de resultados" e pela necessidade de que "o espectador chegue a uma interpretação a partir do exame de traços e marcas da leitura deles como pistas" (Rugoff 1997, 62). O elo perdido entre o funeral do Terminal TWA e o futurismo é assombrado por aquilo que o escritor de ficção científica William Gibson chamaria de os "fantasmas semióticos" do ontem de amanhã. Como a Brasília, de Oscar Niemeyer, a cidade brasileira que parece uma base lunar de Le Corbusier, ou Arcosanati, a tecnópolis de ficção científica semiconstruída, de Paolo Soleri, decompondo-se no deserto do Arizona, o terminal é um daqueles buracos de vermes culturais onde o futuro, como conhecemos no século 20, desapareceu em algum universo alternativo - foi sem deixar rastro, como a viajante abduzido na repugnante obra de suspense The Vanishing (O Desaparecimento). Nesse sentido, a construção de Saarinen é a cena do crime. A galeria do segundo andar do terminal tem enfileirados estandes envidraçados que expõem os clássicos uniformes das "anfitriãs aéreas" há muito desaparecidas. Eu meio que esperei encontrar um encarregado de vôo mumificado em um desses sarcófagos de vidro, ainda elegante nas ruínas em decomposição do seu uniforme "Era Jato", criado para a tripulação de 1960 por Loewy, o apóstolo da aerodinâmica. É a expressão destoante e digna de nota do que conhecemos dos anos 90. Um artigo ainda vivo no arquivo do futuro (i.e., 2001 D.C.) em uma edição de 1969 da revista de vôo do TWA, Ambassador, obviamente incluía o terminal na galeria das obras futuristas que representavam um futuro não era apenas maravilhosos, mas arrogantemente sorridente na fervorosa seriedade do futurismo dos anos 60. Depois, enaltecendo as características da pasta executiva do futuro ("uma comunicação portátil e centro de informática que já tem espaço para meias sobressalentes...[e] sala ampla para almoço futurista"), o "un-by-lined" escritor estimula o leitor dos anos 60 a "fechar com zíper seu terno espacial, embalar suas pílulas, pegar sua pasta tipo 007 e iniciar a contagem regressiva. O mundo do futuro estará aqui mais cedo do que você imagina". Então, em breve, creio, sozinho neste mausoléu de velhos e ainda natimortos amanhãs, que isto, freqüentemente, alcança nossas visões de coisas por vir, tornando-as obsoletas antes que elas cheguem. Ballardd, J.G. 1991. Memories of the space age. In War fever. Nova York: Farrar. Straus. Giroux. Chaplin, J. 1998. Generation Walpaper. New York Times, Sept. 6, Sunday Styles section. Elliot, C. 1998a. Cabin fever rages: Flight attendants take the heat. The crabby traveler (abcnews.com). 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Sidney: Power Institute/ Charlote Book, 2002. Traduzido por Letícia Kalata, Clóvis Victória, Dionei Valler; Maurício Cossio |
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